sexta-feira, 13 de dezembro de 2013

Vida: O Meio da História

         Em um dos dias mais movimentados da ONG, me vi atribulada. Eu não sabia com quem falar, olhava para aqueles tantos rostos, ouvia aquelas tantas vozes e pensava: dessa vez, eu mesma tenho que encontrar uma história; na vez passada, Estrela que me encontrou. Diante do grande fluxo de pessoas dentro da casa, me dirigi para o lado de fora e vi algumas mães conversando. Me aproximei de uma delas, dona S.A.C.B.
         Como tudo tem começo, meio e fim, com a Vida* não é diferente. Desde que nasceu, Vida vivia doente. A família ia constantemente ao hospital e os médicos diagnosticavam os mais diversos problemas. Quando completou 10 anos, há 8 anos, sentiu uma forte dor de cabeça, “Já no hospital, ela teve convulsão, o medico pediu pra fazer uma tomografia, que acusou Astrocitoma Pilocítico (um tipo de tumor juvenil, na cabeça)”, relatou S.A.C.B. Em busca do tratamento adequado, saíram de Cajazeiras em direção a João Pessoa. “Fomos encaminhadas para a capital e chegando aqui caímos nas mãos de um médico irresponsável, causador de um erro cirúrgico!”, completa indignada. Após seis meses nesse outro hospital, mãe e filha foram para os cuidados do Hospital Napoleão Laureano. Ela passou por uma série de exames. O médico disse, após a ressonância, que teria que fazer uma cirurgia novamente para que o tumor fosse removido por completo.
         Quando perguntei sobre a família, dona S.A.C.B. disse que uns apoiam, outros não, a começar por sua mãe, “Ela acha que eu venho pra cá (João Pessoa) para passear, diz que eu acho bom, que eu gosto de andar. Daí eu falo: Quer ir no meu lugar? Quer trocar a cozinha pelo hospital? Nosso passeio no carro de apoio pra ir pro hospital?”.  Ela ainda completa falando sobre a relação com a Donos do Amanhã, “Aqui é maravilhoso! Somos recebidas com carinho, isso ajuda muito no tratamento dela. Sem essa casa de apoio, o que seria de nós? Ficaríamos na rua. Eu tenho elas (as funcionárias) como se fossem minha família, elas conversam com a gente. É aqui eu procuro o apoio que eu não tenho em casa”.
         “Sempre enfrentei tudo, quando eu vejo que o demônio quer me derrubar, Deus me levanta e eu sigo em frente! Ela passa muita força pra mim, quando estou pra baixo, principalmente quando tem resultado de exame. Ela diz: Mainha, deixe de besteira, é em mim!”, diz S.A.C.B. apressada para pegar suas coisas, o carro que as transporta de Cajazeiras para a capital estava chegando.
         Vida ouve nossa conversa atentamente, calada, sentada numa cadeira em frente a mim, balançando as pernas que não alcançavam o chão.
- Ela é sempre assim, quietinha? – perguntei curiosa, afinal ela se mantinha calada, mesmo sendo o assunto da conversa.
- Que nada! Ela é uma ‘papagaia’! Estuda, faz 6º ano, muito sabida. Todo mundo é doido por ela!
         Não me conformei com o silêncio de Vida e perguntei, diretamente, o que ela achava disso tudo, “Minha mãe se preocupa tanto comigo que fica com dor de cabeça. Tem outras coisas também que ela sente e não liga em se cuidar. Eu brigo com ela! Ela não liga para ela, só quer saber de exame meu.”, mostrando maturidade e um certo conformismo com a situação em que se encontra.
         “Doutora Andrea Gadelha já suspendeu tudo, tá entregue na mão de Deus. Ele é maior! Minha filha já passou por várias coisas, já entrou em coma, já foi dada por morta, médico já pediu pra desligar os aparelhos dela, mas não deixei, se eu fizesse isso eu seria uma criminosa.”, disse dona S.A.C.B. Após seis dias em coma, ela retornou. Vida passou por três cirurgias: a primeira de coágulo, segunda e terceira de tumor, num intervalo de seis meses. Fez radioterapia, todos os tipos de quimioterapia e nada mais resolve, nem mesmo cirurgia. Infelizmente o tumor tomou o cérebro por inteiro, também passando para a coluna.
         Uma história que começou, está no meio e aguarda o fim. Esperar, para nós, significa apenas ficar em algum lugar até que chegue alguém ou alguma coisa, mas para elas é ter esperança, é confiar que dias melhores virão, é esperar por um milagre... O milagre da Vida.

*Nomes de crianças e responsáveis serão preservados

Nenhum comentário:

Postar um comentário